Particularidades métodos de avaliação

Particularidades nas Avaliações de Negócios

08/04/2022
Particularidades métodos de avaliação

Existem vários métodos com diversos níveis de complexidade e detalhe, como mencionado no artigo “Métodos de Avaliação de Negócios”. De certa forma, para alguns destes métodos, o objetivo é encontrar um equilíbrio entre detalhe e subjetividade pois, a partir de certo ponto, a introdução de novas variáveis deixa de ser objetivamente suportada. 

Posto isto, iremos neste artigo explorar alguns destes limites bem como os alinhamentos mais comuns e relevantes que um exercício de avaliação normalmente requer, nomeadamente no que diz respeito ao Método dos Fluxos de Caixa Descontados (DCF). 

WACC e Taxa de Crescimento

Uma das análises de sensibilidade mais comuns deste método recai sobre a taxa utilizada para descontar os cash-flows bem como na taxa de crescimento na perpetuidade.

Ambas estas taxas são consideradas no cálculo do valor terminal que, dependendo do contexto, pode significar uma parte considerável do valor da empresa, muitas vezes bem superior a 50%. Para além disso, a WACC afeta também os restantes cash-flows descontados

Esta análise de sensibilidade serve para testar a solidez do modelo perante estas variáveis que, como vimos, são extremamente relevantes embora apresentem um caráter subjetivo. Assim, é importante perceber os limites teóricos e práticos de cada taxa, de forma a apresentar os melhores argumentos no exercício de avaliação. 

Habitualmente, a WACC é calculada através do Capital Asset Pricing Model (CAPM), que considera o ambiente económico onde se insere a empresa, bem como o seu setor, podendo incluir outros ajustamentos relevantes (ex. relativos à fase de maturidade da empresa, riscos específicos geográficos, tecnológicos, etc).

De qualquer forma, esta taxa deve refletir o risco percecionado na oportunidade, muitas vezes relacionada com a estratégia desenhada e a respetiva volatilidade dos resultados. Muitas vezes, como mero exercício representativo, pode ser útil realizar a avaliação considerando uma perspetiva de um potencial investidor uma vez que o perfil de investimento e os retornos pretendidos por estes são muitas vezes expressos publicamente. 

Por outro lado, a taxa de crescimento perpétua, embora possa ter uma componente teórica em seu suporte, pode ser vista dentro dos seguintes limites. Primeiramente, tomando o pressuposto de perpetuidade, a empresa deverá crescer, pelo menos, de acordo com a taxa de inflação. Isto é, mantendo-se toda a performance operacional, os seus cash-flows serão apenas impactados pela taxa de inflação.

Em casos de empresas com negócios maturos, esta taxa é habitualmente considerada pois reflete um desenvolvimento sustentável, em linha com o desenvolvimento geral. Em casos em que se preveja uma deterioração do ambiente económico geral, do setor ou mesmo outras barreias para a empresa, este limite inferior pode ser quebrado.

Por outro lado, existe um limite superior assente na teoria. Admitindo que a empresa cresce a uma determinada taxa de forma perpétua, caso esta taxa seja superior à taxa de crescimento nominal admitida para a economia (taxa de inflação + taxa de crescimento real), o valor da empresa será superior ao valor de toda a economia, a partir de um determinado ponto.

Nos casos em que este crescimento é implicitamente elevado, o ideal será desenhar primeiramente um plano de negócios no qual a empresa cresça de forma sustentável nos últimos anos, de forma a não admitir estas taxas extraordinárias. 

De qualquer forma, ambas estas taxas, pela sua relação no valor terminal, devem também estar alinhadas. Nos casos em que o crescimento esperado é elevado, é necessário alinhar esse crescimento com o respetivo risco e taxa de desconto.

EBITDA e Margens 

No seguimento do alinhamento acima apresentado, o desenho de um plano de negócios que culmine numa estrutura sustentável, quer no sentido de competitividade, quer no sentido de perpetuidade, mitigará o efeito da subjetividade das taxas referidas. Neste sentido, a projeção de margens e a sua manutenção, nomeadamente da margem EBITDA, tornam-se numa das métricas que deverão ser cuidadosamente analisadas.

Pretende-se que este alinhamento tenha, primeiramente, uma evolução possível de se concretizar. Embora possam existir momentos verdadeiramente importantes e que invertam a performance de uma empresa, uma mudança brusca das margens da mesma pode indicar que o modelo não é seguro e/ou que existem pressupostos com variações consideráveis muitas vezes difíceis de justificar, pelo que tal dificuldade deve ser considerada no risco assumido.

Em casos de empresas na sua fase inicial, que muitas vezes apresentam margens fortemente negativas, a volatilidade das projeções pode levar a uma volatilidade das margens observadas, indicando o elevado risco da possível evolução do negócio. 

Para além da sua volatilidade, esta margem terá de estar enquadrada, em primeiro lugar, com o setor em causa e, sem segundo lugar, quase como um ajustamento ao benchmark, com o modelo de negócio da empresa (como está organizada, a sua tecnologia, etc).

Este alinhamento é extremamente importante pois considera a competitividade que pode surgir e os respetivos limites, ao enquadrar com o setor, e estrutura uma performance concretizável dentro do horizonte temporal considerado.

Neste sentido, ajustar o horizonte temporal de acordo com as necessidades de estruturação do plano de negócios é uma das formas de solidificar este alinhamento. Ou seja, para empresa mais maturas podem-se desenhar planos mais curtos uma vez que a estrutura já se encontra próximo do sustentável, não havendo necessidade de maior detalhe no médio e longo prazo.

Em start-ups, por exemplo, o horizonte temporal pode ser mais alargado de forma a suavizar o plano de negócios, as respetivas projeções e refletir com maior detalhe o potencial da empresa, tendo em consideração que a subjetividade aumenta com este alargamento temporal.

No entanto, não se pode deixar de considerar que a evolução pode surpreender e diferir das projeções realizadas, apenas são caminhos menos prováveis de se concretizarem.

Fundo Maneio

Para além da sua performance operacional, também é necessário projetar a sua gestão de tesouraria e liquidez. Dependendo do caso, o fundo de maneio pode ser um fator determinante na avaliação de uma empresa, uma vez que esta gestão está relacionada com as disponibilidades existentes, algo que pode definir a sustentabilidade do negócio.

O fundo de maneiro pode ser resumido em três grandes áreas: o relacionamento com os clientes, o relacionamento com os fornecedores e a gestão interna de inventários.

Da mesma forma que se procedem a outros pressupostos, o relacionamento com os clientes e fornecedores, bem como a gestão de inventários, deve estar alinhado/tender para com as métricas do setor, isto pois são fatores estratégicos normalmente replicados entre empresas concorrentes, definidos de acordo com as necessidades e riscos do negócio e setor. 

Partindo daí, podem existir ajustamentos consoante o modelo de negócio da empresa, a sua tecnologia e o poder negocial que tem ou poderá vir a ter, sendo que é habitual empresas de maior dimensão exibirem um maior poder negocial.

Tendo em conta estes valores teoricamente sustentáveis, a evolução da situação atual para esta tendência deve ser tratada de forma suave.

Por exemplo, caso a empresa termine o ano com cerca de 100 dias de vendas ainda por receber e a média do setor for 60 dias, o valor do próximo ano não deverá ser imediatamente corrigido para a tendência, algo que poderia impactar positivamente os cash-flows do ano seguinte embora possa não se concretizar. 

Da mesma forma para os clientes e tendo em conta a gestão de inventários, a projeção destas rubricas pode-se basear de forma relativa, através de prazos médios (de pagamento, de recebimento e de rotação de inventário), embora deva ser analisada de forma absoluta e contextualizada com a situação atual.

Assim, as disponibilidades da empresa podem ser estimadas com maior detalhe, algo necessário para confirmar o funcionamento da empresa, por exemplo, no que toca ao pagamento de juros e dívida.

No final, espera-se que a empresa mantenha a estrutura assumida como “sustentável”, algo que normalmente acaba por resultar em investimentos ou desinvestimentos contínuos em Fundo de Maneio, consoante o setor e modelo de negócio. 

Outras particularidades nas Avaliações de Negócios

Capex vs Depreciações

No desenvolver de um Plano de Negócios, no qual se pode basear uma avaliação, será necessário projetar para um determinado horizonte temporal os investimentos que a empresa realizará nos seus vários ativos. Estes ativos, consoante o setor de atividade da empresa, podem-se concentrar em ativos fixos tangíveis ou em ativos intangíveis. 

Primeiramente, no caso de empresas com um elevado peso de ativos fixos tangíveis, por exemplo, em empresas de produção industrial, a atividade operacional está extensivamente ligada aos investimentos realizados.

Neste sentido, instalações e terrenos são necessários para albergar as atividades (embora possam ser arrendados), os equipamentos necessários para proceder à produção (ou outras atividades) e veículos e outros materiais necessários para as atividades de armazenamento e logística. Tendo em conta esta necessidade, a empresa encontra-se também limitada por estes ativos que suportam todo o negócio.

Em caso de expansão da atividade operacional, a empresa pode ver-se obrigada a investir de forma considerável num destes ativos. Deste modo, é necessário alinhar a atividade operacional com as suas necessidades físicas que, felizmente, costumam apresentar um caráter mais objetivo que outras necessidades mencionadas. 

Num outro ponto, e em linha com o desenvolvimento tecnológico atual, existem empresas que investem fortemente em ativos intangíveis. De certa forma, os principais investimentos resumem-se na marca e em tecnologia própria, como softwares e algoritmos.

Estes investimentos, embora possam consistir numa clara aquisição de software, podem ser muitas vezes desenvolvidos internamente, resultado em propriedade própria e, a partir de determinado ponto, consideradas no balanço da empresa. Este desenvolvimento é, muitas vezes, feito com recursos humanos internos e em subcontratações. De forma semelhante a gastos de publicidade, alguns gastos considerados anualmente na Demonstração de Resultados, podem eventualmente ser refletidos no balanço. 

Posto isto, estes investimentos, seja por via direta em ativos fixos tangíveis, ou por reconhecimento futuro, serão depreciados apropriadamente, algo que beneficiará as contas da empresa, as suas disponibilidades e os cash-flows percecionados pelos acionistas devido ao benefício fiscal. Desta forma, alguns cash-flows relevantes e mesmo pequenas mais valias podem ser adequadamente projetadas, alinhando com um possível caminho de evolução. 

Capex e Perpetuidade

Como mencionado, os investimentos, nomeadamente em ativos fixos tangíveis, suportam a atividade operacional, mas também podem ser vistos como o seu limite. Neste sentido, adotando a perspetiva de um Modelo de Fluxos de Caixa Descontados, o cálculo do valor terminal deverá estar corretamente alinhado com os investimentos realizados no horizonte temporal projetado, bem como com os investimentos futuros. 

O valor terminal corresponde ao valor atribuído à empresa no final do horizonte temporal considerado e utiliza as últimas projeções realizadas bem como o risco considerado (WACC) e também a taxa de crescimento perpétuo (g). Esta taxa, como falado anteriormente, tem os seus limites teóricos, fortemente assentes na taxa de inflação projetada. De qualquer forma, a definição desta taxa tem de estar alinhada com o CAPEX realizado.

Principalmente no caso de empresas com elevada concentração neste tipo de ativos, não se podem admitir elevadas taxas de crescimento perpétuo caso este crescimento não seja acompanhado por investimentos relevantes no médio e longo prazo. 

Assim, no último período projetado é importante definir uma estrutura de investimento sustentável. Os cash-flows considerados para esse período são bastante importantes uma vez que são utilizados diretamente no cálculo do valor terminal, pelo que não considerar qualquer investimento nesse período, caso não sejam realizados ajustamentos, o cálculo do valor terminal não terá em consideração um investimento em ativos fixos tangíveis, algo que pode impactar fortemente a avaliação da empresa. 

Em linha com o mencionado no ponto anterior, as depreciações podem também ser vistas como um benchmark de investimento. Realizar investimentos dentro do valor depreciado pode ser visto como investimento de manutenção, uma vez que se resume a pequenos investimentos para manter os ativos existentes.

Caso o investimento ultrapasse o valor das depreciações, o investimento pode ser denominado de expansão e existirão expectativas de crescimento para essa mesma empresa. No entanto, estes investimentos devem ser corretamente contextualizados para enquadrar os níveis de investimento com a taxa de crescimento admitida. 

Start-ups

Este ponto será mais geral e focar-se-á na atividade de avaliação de empresas numa fase inicial de desenvolvimento, como start-ups

Empresas nesta fase de maturidade apresentam habitualmente contas bastante voláteis, saldos e posições negativas, aparentemente indicativos de maus negócios. No entanto, esta fase inicial de investimento é também a fase da criação dos vários suportes ao crescimento da empresa. É habitual estas empresas exibirem resultados negativos quer pelos elevados investimentos e despesas, mas também pelo habitual baixo volume de vendas. No entanto, o objetivo é mesmo criar uma estrutura consistente para o desenvolvimento futuro do negócio. 

Estas empresas, fora ativos fixos tangíveis, apresentam muitas vezes elevadas despesas em Recursos Humanos, Serviços Externos e também em Publicidade e Propaganda, gastos do presente para consolidar a estrutura e reconhecimento do negócio, mitigando eventuais barreiras e melhorando a competitividade da empresa. 

Neste sentido, pelos gastos e margens negativas exibidas nesta fase inicial será importante desenhar um plano de negócios que evolui de forma suportada e plausível. Criar um destes planos de negócios conservadores, no qual os investimentos realizados apresentam impactos futuros minimamente plausíveis, é útil para entender o risco da expansão do negócio, a sensibilidade de determinados pontos e também funciona como uma definição de metas a cumprir.

Alinhando com algumas particularidades até agora referidas, a evolução não deverá ser drástica em todas as vertentes. A empresa pode surpreender em termos de vendas, mas pode também investir acima do previsto, bem como que as relações com clientes e fornecedores podem até deteriorar. Definir então um plano com vários destes cuidados considerados, dará lugar a um caminho com uma probabilidade considerável. 

De qualquer forma, estimar outras evoluções será importante para aferir o risco e potencial da empresa, resultando em avaliações bastante voláteis que podem ser consideradas em conjunto utilizando probabilidades.

No geral, é um exercício complexo que pode (e deve) até basear-se noutros benchmarks de avaliação: método dos múltiplos (embora haja alguma dificuldade no enquadramento das empresas comparáveis) ou métodos específicos, definidos por especialistas da área que estão frequentemente envolvidos em transações do setor naquela fase de maturidade.