Finanças Comportamentais - Artigo ISEG Junior Business Consulting

Finanças Comportamentais

17/01/2024
Finanças Comportamentais - Artigo ISEG Junior Business Consulting
Introdução

Nas últimas décadas, as Finanças Comportamentais emergiram como um campo dinâmico, desafiando as premissas das teorias financeiras convencionais. Diante das limitações percebidas dessas teorias, esta subcategoria da área financeira oferece uma abordagem que reconhece a complexidade do comportamento humano nas decisões financeiras.

Neste contexto, examinaremos como este campo se desenvolveu, destacando os enviesamentos comportamentais que moldam as decisões financeiras e desafiando conceitos tradicionais. Além disso, abordaremos as anomalias de mercado, famosos debates do tema, explicações de entendidos na área da psicologia, assim como críticas e limitações das finanças comportamentais.

Como surgiu?

Até um certo período de tempo, acreditava-se que teorias financeiras convencionais eram suficientemente capazes de prever e explicar determinados eventos económicos. Com o passar do tempo, foi se tornando cada vez mais claro que o mundo real é bastante mais complexo, e não tão linear. Os agentes económicos não são racionais e previsíveis como sugeriam os modelos.

Foi neste contexto que nasceram as Finanças Comportamentais. Daniel Kahneman, Amos Tversky e Richard Thaler foram alguns dos importantes intervenientes na história desta ciência comportamental.

Compreender a natureza humana tornou-se crucial, pois, em qualquer atividade, produto ou serviço, incluindo o setor financeiro, os indivíduos procuram invariavelmente três tipos de benefícios: utilitários, expressivos e emocionais. Os benefícios utilitários abordam a questão do que algo faz pela carteira do indivíduo, enquanto os benefícios expressivos exploram o que algo comunica sobre a pessoa aos outros e a si mesma. Por fim, os benefícios emocionais respondem à pergunta sobre como algo afeta o estado emocional do indivíduo.

Assim, a área das Finanças Comportamentais emergiu como um campo dedicado ao estudo das atitudes e ações das pessoas, reconhecendo a complexidade e a influência dos fatores comportamentais na tomada de decisões financeiras.

O que é?

Deste modo, as finanças comportamentais podem ser analisadas a partir de várias perspetivas. Os rendimentos no mercado de ações constituem um domínio financeiro em que os comportamentos psicológicos são frequentemente considerados como influenciadores dos resultados e dos retornos. Contudo, há uma multiplicidade de perspetivas para explorar nesta área. O propósito fundamental desta área económica-psicológica é proporcionar uma compreensão mais profunda das razões subjacentes às escolhas financeiras individuais e avaliar o impacto dessas decisões nos mercados.

As finanças comportamentais assumem que os investidores são seres humanos falíveis, que são influenciados por enviesamentos cognitivos e emoções. Esses enviesamentos podem levar os investidores a tomar decisões financeiras que não são racionalmente ótimas. A tomada de decisões financeiras é uma atividade complexa que envolve uma variedade de fatores, incluindo a saúde mental e física do investidor. As flutuações no bem-estar pessoal do investidor podem afetar a capacidade de tomar decisões racionais em relação a questões financeiras, mas não são o único fator determinante.

Enviesamentos

Um dos principais aspetos no estudo das finanças comportamentais reside na análise da influência dos enviesamentos na tomada de decisão. Os enviesamentos cognitivos são padrões de pensamento que levam a decisões irracionais. Estes podem ocorrer por uma multiplicidade de razões, sendo comumente classificados sob um dos cinco conceitos fundamentais:

  • Primeiramente, a contabilidade mental é um enviesamento cognitivo que leva as pessoas a organizar as suas finanças em categorias separadas, mesmo que essas categorias sejam, na verdade, interdependentes. Por exemplo, uma pessoa pode ter uma conta bancária separada para despesas de lazer e outra para despesas de alimentação. Esta compartimentalização pode dar a ideia de que se possui mais dinheiro do que o que se tem na realidade.
  • Em segundo lugar, o comportamento de rebanho leva as pessoas a imitar o comportamento financeiro da maioria das pessoas, mesmo que isso signifique ignorar as suas próprias crenças e informações. No mercado de ações, o comportamento de rebanho pode levar a ciclos de alta e baixa dramáticos, pois as pessoas compram e vendem ações em ondas, seguindo a opinião da maioria.
  • Em seguida, a lacuna emocional manifesta-se na tomada de decisões com base em emoções extremas ou tensões emocionais, como ansiedade, medo ou excitação. Em muitas situações, as emoções desempenham um papel preponderante, tornando-se a principal razão pela qual as pessoas não optam por escolhas totalmente racionais.
  • Em quarto lugar, a ancoragem refere-se à vinculação de um nível de gastos a uma determinada referência. Por exemplo, uma pessoa pode ancorar-se ao preço de um objeto numa loja da sua cidade e ficar menos propensa a comprá-lo em qualquer outra loja se o preço for mais alto independentemente da melhoria da qualidade.
  • Por fim, a atribuição pessoal diz respeito à propensão de realizar escolhas fundamentadas numa confiança excessiva no próprio conhecimento ou competências pessoais. A atribuição pessoal geralmente resulta de uma habilidade intrínseca numa área específica. Dentro desta categoria, os indivíduos têm a tendência de avaliar o seu conhecimento como sendo mais elevado do que o dos outros, mesmo quando, objetivamente, isso não se verifica.

 

Relação dos Pensamentos - Artigo ISEG

Relação do Pensamento com a Economia e exemplos

No livro "Thinking, Fast and Slow", de Daniel Kahneman, a aversão à perda é caracterizada como a propensão das pessoas a preferirem evitar uma perda em vez de procurar obter o mesmo ganho.

Kahneman explica que a aversão à perda é resultado de dois sistemas de pensamento que operam na nossa mente. O primeiro sistema, rápido, intuitivo e emocional, é mais propenso a ser afetado pela aversão à perda já que é mais sensível às mudanças e emoções. O segundo sistema, por sua vez, é lento, deliberativo e lógico.

De forma a corroborar a sua teoria, foram elaborados, pelo autor, estudos entre os quais os participantes foram convidados a escolher entre duas opções:

1. A primeira opção oferecia aos participantes a possibilidade de ganhar $200 com 80% de probabilidade.

2. A segunda opção oferecia $100 garantidos.

A maioria dos participantes escolheu a opção “segura”, ainda que a opção com risco tivesse um maior valor esperado.

A aversão à perda pode levar a decisões que são irracionais ou ineficientes. Por exemplo, as pessoas podem ser mais propensas a manter um investimento perdedor do que a vender e assumir uma perda. Isso ocorre porque a aversão à perda pode fazer com que as pessoas vejam o investimento perdedor como um custo irrecuperável, o que torna mais difícil tomar uma decisão racional.

Debates

Num cenário atual de debate, destacam-se dois paradigmas em finanças: a teoria dos mercados eficientes e as finanças comportamentais. A teoria dos mercados eficientes postula a eficiência informacional, onde os preços refletem todas as informações disponíveis, a racionalidade dos investidores na tomada de decisões e a impossibilidade de alcançar lucros anormais. Esta perspetiva sugere que todas as ações são negociadas pelo seu preço justo.

Por outro lado, as finanças comportamentais argumentam que fatores emocionais e cognitivos influenciam os investidores, podendo distorcer os preços dos ativos. Embora a teoria dos mercados eficientes afirme que os preços refletem todas as informações, as finanças comportamentais questionam essa premissa. Evidências empíricas indicam que os investidores são frequentemente afetados por emoções como medo e ganância, desafiando a ideia de eficiência total.

Para além das evidências empíricas, há suporte teórico nas finanças comportamentais, que oferecem uma explicação sobre como os enviesamentos emocionais e cognitivos dos investidores podem distorcer os preços dos ativos.

Anomalias de Mercado

Muitas vezes, como consequência dos enviesamentos, ocorre algo a que chamamos de anomalias de mercado. As anomalias de mercado são acontecimentos ou ocorrências nos mercados financeiros que não vão de encontro àquilo que foi previsto pelos modelos financeiros.

Existe, por exemplo, o chamado Efeito Momentum, isto é, existe uma tendência para os ativos que recentemente registaram retornos elevados a continuarem a superar o desempenho, enquanto ativos com baixos retornos tendem a continuar a ter um desempenho inferior.

Esta anomalia pode ser explicada pela reação excessiva dos investidores, pela sub-reação a novas informações e pelo comportamento da procura.

Outro exemplo de anomalia de mercado é o Efeito janeiro. De acordo com o efeito janeiro, as ações que tiveram um desempenho inferior no quarto trimestre do ano anterior tendem a superar as médias de referência dos mercados, ou por outras palavras, o retorno das ações é maior no mês de janeiro em comparação com o resto do ano.

Rozeff and Kinney (1976) realizaram um estudo abrangente sobre as cotações da Bolsa de Valores de Nova Iorque de 1904 a 1974, concluindo que o retorno médio em janeiro era de 3,5%, enquanto nos outros meses era apenas de 0,5%

A explicação mais discutida para o Efeito Janeiro é a hipótese de "tax-loss selling" (venda para perda fiscal). Segundo esta teoria, investidores racionais vendem ações com perdas no final do ano fiscal para reduzir os impostos, aumentando assim as perdas de capital. Essa pressão de venda afeta negativamente as ações, que já apresentavam quedas, mas em janeiro, após o fim do ano fiscal, a pressão diminui, permitindo a recuperação dos preços.

Outra explicação proposta é o fenómeno de "window-dressing" (embelezamento da carteira)  por investidores institucionais, onde gestores de fundos vendem ações com desempenho inferior antes do final do ano para evitar revelar más escolhas aos investidores. Em janeiro, ocorre o oposto, com o reinvestimento em ações de empresas com menor valor de mercado e maior risco.

Continuando no campo das anomalias de mercado, destaca-se a anomalia das Reversões de Mercado. Foi detetada uma particularidade nos extremos do desempenho das ações ao longo de períodos, geralmente um ano. Constatou-se que as ações de empresas com melhor desempenho sofrem frequentemente uma inversão de cenário, tornando-se menos favorecidas no ano subsequente.

Esta anomalia é, de certo modo, fundamentada nos princípios de investimento: quando uma ação se destaca como líder de mercado, é provável que o seu valor reflita esse sucesso, levando-a muitas vezes a ser sobreavaliada.

Por fim, e à medida que as anomalias de mercado se manifestam, a noção de eficiência do mercado revela-se dinâmica. Contudo, é importante reconhecer que as próprias anomalias também são mutáveis. Embora a repetição dessas discrepâncias possa aumentar a confiança na possibilidade de obter lucros, os investidores devem estar cientes de que os padrões históricos nem sempre prevêem com fiabilidade o desempenho futuro.  É fundamental que as anomalias de mercado influenciem, mas não ditem as decisões de investimento.

Críticas e Limitações

A “Teoria das Finanças Comportamentais” enfrenta uma crítica central ao ser frequentemente concebida como uma análise destrutiva das teorias financeiras convencionais, sem apresentar alternativas concretas. Além disso, muitos investidores argumentam que esta abordagem afeta negativamente a confiança na sua capacidade de tomar decisões informadas.

Uma das limitações das finanças comportamentais é a dificuldade de medir o impacto dos enviesamentos emocionais e cognitivos na tomada de decisão. Além disso, existe o risco de que esses conhecimentos sejam usados de forma abusiva por profissionais financeiros ou organizações, que podem explorar as tendências emocionais das pessoas para obter lucro.Não obstante, algumas análises indicam que, apesar do risco potencial de abuso do conhecimento da àrea das Finanças Comportamentais, a consciencialização sobre enviesamentos emocionais pode capacitar os investidores.

Ao compreender estes fatores, os investidores podem desenvolver estratégias mais resilientes, resistindo a influências manipulativas e, assim, tomando decisões mais fundamentadas. Neste sentido, a aplicação ética e educativa destes insights não só ajuda a mitigar o risco associado à exploração das tendências emocionais humanas, como também fortalece a tomada de decisões no campo financeiro.

Conclusão

Em resposta às limitações reconhecidas das teorias financeiras convencionais, surgiram as Finanças Comportamentais. Compreendendo a complexidade da natureza humana, este domínio explora os fatores comportamentais que influenciam as decisões financeiras através de uma perspectiva inovadora, explorando a interseção entre psicologia e finanças.

Os enviesamentos, como a aversão à perda e o comportamento de rebanho, desempenham um papel crucial, influenciando, muitas vezes, escolhas subótimas. Anomalias de mercado, como o Efeito Momentum, desafiam as previsões dos modelos tradicionais.

O debate entre a teoria de mercados eficientes e finanças comportamentais destaca a divergência nas visões sobre a eficiência informacional e a racionalidade dos investidores.

Contudo, as finanças comportamentais são alvo de críticas por serem consideradas destrutivas e não apresentarem alternativas claras. No entanto, o campo continua a evoluir, ao refinar a compreensão dos enviesamentos e explorar soluções concretas.

Conclusão do Artigo sobre Finanças Comportamentais