Existem várias formas de abordar e estruturar um processo de fusão ou aquisição. Apesar de cada processo ter naturalmente as suas particularidades, as quais podem exigir adaptações enquanto este já se encontra a decorrer, em seguida são reunidos alguns dos pontos mais importantes que deverão ser considerados por quem estiver a preparar um negócio para uma possível venda.
A principal dificuldade que geralmente compromete a parte vendedora prende-se com a capacidade de adotarem a perspetiva do lado comprador. Apesar de o lado vendedor possuir um vasto conhecimento não só do negócio, mas também do potencial de crescimento que este apresenta, é importante ser capaz de materializar estas questões para que qualquer investidor consiga facilmente aperceber-se destas forças competitivas e oportunidades de mercado. Posto isso, quanto mais atraente uma empresa for, maior será o poder negocial para o vendedor e maior será o valor potencialmente obtido pela transação.
Normalmente, aconselha-se que a venda de uma empresa comece a ser preparada com um ou dois anos de antecedência uma vez que, na maior parte dos casos, as empresas não estão otimizadas para este processo. Durante esta preparação da empresa para a venda deverá ser procurado consolidar todos os pontos críticos do negócio. Também ao nível das oportunidades de crescimento, quer a nível orgânico (como o desenvolvimento de novos produtos/serviços ou a expansão geográfica) quer a nível inorgânico (nomeadamente a aquisição de empresas a jusante ou a montante), qualquer progresso inicial concretizado confortará os investidores sobre a real capacidade em explorar tais vertentes de negócio, e irá permitir-lhes construir uma estratégia de crescimento futuro até um eventual momento de saída conjunta.
Para tal, reunimos em seguida um conjunto de passos que deverão ser incluídos durante o processo de otimização e preparação de uma empresa para a respetiva venda.
Nesta fase, o primeiro passo será realizar uma análise detalhada dos produtos/serviços oferecidos. Para além de distingui-los nos diversos segmentos em que estes se possam inserir, a análise deve também fornecer informação quantitativa como os custos da empresa, as margens aplicadas, entre outras.
Após recolhida e analisada a informação acerca do portfólio da empresa, devem ainda ser questionadas as diferentes estratégias de otimização possíveis:
A questão da potencialidade de exportação torna-se importante para os investidores no sentido em que lhes dá uma maior noção da escalabilidade real do negócio, uma vez que existindo esta possibilidade de exportação as limitações geográficas não serão um fator impeditivo de crescimento.
No processo de preparação de uma empresa para venda é importante manter um controlo sobre o volume de stock da empresa e os respetivos valores de mercado. Quando uma empresa não tiver contabilizado todo o stock de forma devida, o negócio poderá ser subavaliado por não considerar todos os ativos atualmente detidos. Por outro lado, também a produção excessiva e consequente armazenamento de volumes elevados de stocks não contribuirão para a otimização da estrutura do negócio, ao reterem capital que poderia ser alternativamente aplicado em ativos mais rentáveis e/ou para remunerar os sócios ou acionistas.
Em suma, deverá ser procurado otimizar a composição do stock face às necessidades especificas do negócio, sempre que possível minimizando os custos associados com a emissão de novas ordens de compra, armazenamento, e custos esperados em situação de uma eventual rotura de stock.
Existem negócios que operam com base em ordens recorrentes, enquanto outros atuam numa ótica de projeto a projeto. Em ambas as situações, importa aqui fazer uma análise ao portfólio de clientes histórico e atual, tanto em termos de quantidade como qualidade.
No caso de uma empresa ter apenas um conjunto reduzido de clientes, talvez seja importante ponderar adotar uma estratégia de captura de novos clientes para o negócio, sobretudo se aqueles clientes atuais não apresentarem um perfil de recorrência. Esta captação de novos clientes, para além de poder passar pela adaptação do portfólio de produtos e serviços às respetivas necessidades, deverá envolver também a definição de uma estratégia comercial estruturada e robusta.
Após analisada a quantidade de clientes, deverá também ser estudada a qualidade dos mesmos. A título de exemplo, em algumas situações particulares podem existir clientes que subscreveram a condições especiais no passado, mas que não são atualmente benéficas para a rendibilidade do negócio. A solução pode assim passar pelo abandono deste tipo de clientes, o qual irá no curto prazo levar a uma redução das vendas (em quantidade) mas gerar ganhos no longo prazo em termos de margens e gestão operacional.
Nesta fase, torna-se importante recorrer ao apoio de um consultor financeiro especialista em processos de fusões e aquisições, de modo a alinhar a estrutura empresarial e os objetivos da parte vendedora com o tipo de operação mais adequado para tal efeito.
Existem diversos fatores ao nível da estrutura empresarial que podem afetar diretamente o processo de venda, nomeadamente:
Neste momento, pode também ser importante algum tipo de assessoria jurídica, no caso de a empresa ter uma estrutura familiar. Nestes casos, o processo de venda desencadeia muitas vezes desavenças e discussão entre sócios familiares, pelo que o apoio de um especialista em assuntos legais de tal índole ganha especial relevo.
Também no âmbito fiscal poderão surgir diversas questões de complexidade variada, nomeadamente quando o objetivo é definir a estrutura de transação ideal para minimizar os encargos tributários daí resultantes para ambas as partes, o que justificará em diversas situações a atuação de um especialista nesta matéria.
Nunca é demais realçar a importância do capital humano para o sucesso de um negócio, e também aqui importa estudar a estrutura de recursos humanos com que a empresa pode contar, tanto em termos quantitativos como qualitativos.
Nesta fase pretende-se aferir o grau de dependência da empresa face a certos trabalhadores-chave. Caso a empresa se encontre dependente de um grupo restrito de colaboradores para garantir o normal funcionamento da sua atividade, então terá de ser garantida uma estrutura de incentivos adequada que leve à retenção destes pelo menos até que o respetivo know-how possa ser transmitido para um conjunto mais alargado de membros, se assim se definir.
Ainda acerca da força laboral da empresa, é indispensável que todos os trabalhadores estejam devidamente regulados, sem nenhum processo problemático em curso. Os investidores que identificarem alguma irregularidade no campo do direito do trabalho podem ficar reticentes na compra do negócio – de facto, qualquer processo litigioso em curso pode funcionar como um fator de repulsa à venda de um negócio.
Existe um nível de endividamento sustentável e um plano de amortização adequado, que não coloque em questão a liquidez e solvabilidade da empresa?
A definição de um plano viável e que garanta um nível de dívida saudável funcionará não só como um importante instrumento de apoio à gestão, mas também permitirá a um potencial investidor analisar com maior detalhe a capacidade de libertação de fundos da empresa, através do qual é calculado o retorno potencial do investimento.
Em termos de gestão interna, a preparação de um orçamento anual no final de cada exercício é necessária para o devido planeamento e estabelecimento de objetivos a curto e médio prazos. Além disso, a manutenção do controlo das contas numa base mensal deve considerar os desvios orçamentais e as respetivas origens, para que a estratégia delineada inicialmente possa ser devidamente ajustada em tempo útil.
Deve procurar-se ainda elaborar um mapa mais detalhado da dívida financeira da empresa, sendo importante diferenciar os vários itens em que esta se decompõe. Com especial atenção à dívida com um custo financeiro associado, tanto proveniente de bancos como de qualquer outra instituição ou natureza (leasing, empréstimos obrigacionistas, desconto de faturas, etc.). Outra questão que deve ser gerida é a dívida proveniente de sócios ou acionistas: se existir, deve ser formalizada atempadamente através de contratos de empréstimo para que fique claro como vai ser amortizada quando chegar o momento de efetuar a transação.
O excedente de liquidez deve ser revisto frequentemente. Por vezes, várias pequenas e médias empresas adotam um perfil mais conservador e limitam a distribuição de lucros durante diversos exercícios. Tal situação pode provocar um aumento dos montantes retidos em caixa, que por sua vez não estão a gerar um rendimento nem são utilizados para remunerar os sócios/acionistas, e por isso poderão estar subaproveitados.
Conforme já referido em outros artigos da Crowe, a realização de uma avaliação do negócio desempenha um papel importante em qualquer processo de compra e venda.
Para além de delimitar um intervalo de valores que poderão ser utilizados como referência para o processo de negociação, a avaliação do negócio vai ajudar a entender todos os pontos fortes e fracos, numa ótica financeira, e de que forma estes impactam o valor da empresa. Consegue-se assim analisar os principais value drivers do negócio e ainda identificar os principais fatores de risco que poderão comprometer o valor da empresa, permitindo assim de forma antecipada promover as forças/oportunidades e limitar as fraquezas/ameaças, consequentemente maximizando o valor da empresa no momento da venda.
No momento da venda será realizada uma Due Diligence ou auditoria financeira, pelo que uma avaliação prévia pode também ajudar a antecipar falhas que possam ser identificadas e corrigidas num momento anterior a este processo. Esta avaliação antecipada permitirá ainda acelerar outros requerimentos no momento da venda, preparando atempadamente grande parte da informação que será exigida no decorrer do processo.
Todas as questões aqui abordadas deverão em última instância estar materializadas num “Business Plan” claro e robusto, que permita a qualquer leitor entender não só o ponto de partida do negócio, mas também como é que as oportunidades de crescimento identificadas permitirão a um investidor obter um retorno atrativo num prazo de tempo relativamente curto.
Através deste plano deve então ser possível responder a perguntas como:
Ter estas respostas documentadas num plano estratégico para 3 a 5 anos é um indicativo importante de organização e de inteligência empresarial – aumenta a confiança do investidor, reduz o risco percebido e aumenta o valor potencial da empresa.
Com recurso a este tipo de plano estratégico, o investidor tem mais ferramentas para tomar uma decisão sobre a sua participação no futuro do negócio. Contudo, a elaboração deste Business Plan deve contar uma história robusta e evitar representar cenários demasiado otimistas, pois estes acabarão inequivocamente por ser postos em causa por qualquer potencial comprador. Caso a empresa não consiga desenvolver este plano com o devido rigor, também aqui será fundamental a presença de um assessor financeiro que possa destacar os principais pontos-chave a trabalhar e garantir que o trabalho realizado é robusto quer em termos qualitativos, quer em termos quantitativos.
Em suma, a preparação e otimização atempada do negócio permitirá não só antecipar potenciais bottlenecks que de outra forma se tornariam problemáticos num momento posterior, mas também garantir que o vendedor consegue obter o máximo valor da transação. São vários os aspetos a considerar, pelo que a preparação de uma empresa para uma potencial venda deverá ser realizada com a devida antecedência. Apesar do esforço inicial exigido, atuando desta forma o vendedor garantirá não só que o processo será mais breve, mas também que o valor que retirará do mesmo será aquele que reflete o verdadeiro potencial do seu negócio.
Artigos relacionados