iu

Family Office, que bicho é esse?

Ricardo Rodil | Sócio-Líder de Capital Markets
16/05/2023
iu

Neste breve insight, não vamos falar das grandes empresas familiares, como o Magazine Luiza, por exemplo. Nosso interesse estará centrado no Family Office de pequeno e médio porte.

Você, proprietário de uma empresa familiar de médio porte, me diga: já viu algum outro empresário se queixar de que não tem sucessão dentro da família para a condução da empresa? E alguém reclamando de que as desavenças familiares se refletem, sempre de forma negativa, no desempenho do negócio? E outro que não consegue apaziguar a briga do filho e do genro a respeito de quem vai se sentar na cadeira do CFO? A “novela” parece conhecida. A boa notícia é que vou dar alguns “palpites” que podem ajudar nestas (e tantas outras) circunstâncias rotineiramente enfrentadas pelas empresas familiares no Brasil – e no mundo inteiro. A má notícia é que não existe uma solução mágica para apresentar, somente procedimentos para minimizar os danos e garantir que nada seja prejudicada.

E agora vamos falar do “bicho” do título: a chamada Family Office. Antes de mais nada é bom falar que esse nome tem se popularizado para designar uma série de procedimentos destinados a minimizar o impacto dos riscos trazidos pelo tipo de problemas referidos no parágrafo anterior e que tanto atrapalham o bom andamento das empresas familiares. Na verdade, a expressão Family Office surgiu com um sentido mais restrito, para se referir a escritórios especializados na assessoria a grupos familiares. Estes escritórios são do tipo faz-tudo e, usualmente, são conduzidos por profissionais de larga experiência em assuntos empresariais, financeiros, legais, contábeis e de investimentos.

Mas vamos alargar um pouco a visão. Pela minha experiência, os problemas nas empresas familiares estão concentrados nas seguintes áreas: assuntos das relações familiares, temas relacionados com a propriedade das empresas, aspectos relativos à condução dos negócios, problemas na sucessão nas empresas e questões financeiras e de investimentos. Muitos destes assuntos vêm usualmente entrelaçados, não sendo muito fácil distinguir os limites entre eles e o grau de influência de cada um. Para fins didáticos, vamos tentar analisá-los separadamente:

 

Relações familiares: as questões familiares (por óbvio, especialmente as desavenças) costumam interferir na condução dos negócios e na tomada de decisões que levem em conta apenas o interesse das empresas e de seu crescimento, rentabilidade e continuidade.

Soluções propostas: (i) criar algum tipo de colegiado, que pode ser chamado de assembleia da família, conselho de família e que deveria incluir algum terceiro, para operar como conciliador ou mediador; (ii) estabelecer uma agenda estratégica da família, destinada a conciliar os diversos interesses e a alinhá-los com os interesses da(s) empresa(s); e (iii) encontros familiares específicos para tratar dos temas da(s) empresa(s), preferivelmente com a condução de um mediador.


Propriedade da(s) empresa(s): intimamente ligado com o tema da sucessão dentro da família, as questões mais comuns dizem respeito ao conceito de justiça na participação societária que cabe a cada um, frequentemente ligadas à discussão sobre quem colaborou mais para a criação e crescimento da empresa e que, logicamente, teria direito a uma participação maior.

Soluções propostas: (i) assembleias de sócios podem determinar os critérios para essas atribuições; (ii) o estatuto ou o contrato social, se bem elaborado sob os cuidados de profissional experiente, pode estabelecer regras justas; e (iii) acordos de acionistas podem elaborar lineamentos que venham a ser aceitos por todos.


Condução dos negócios: aqui se concentram os problemas e discussões que parecem ser mais difíceis de resolver e que tendem a impactar de modo mais sério as atividades da(s) empresa(s), pois amiúde cada indivíduo se sente como se tivesse as soluções e ideias mais adequadas referentes à condução dos negócios.

Soluções propostas: (i) montar uma estrutura de governança corporativa robusta, que permita que se sigam linhas bem definidas de decisões, desde que não “engessem” os processos; (ii) criar regras de cumprimento (“compliance”) firmes nas áreas de assuntos legais, regulatórios, fiscais e ambientais; e (iii) criar, implantar e operar sistemas robustos de controles internos. Novamente, a intervenção de profissionais experientes para guiar estes processos é altamente recomendável.


Sucessão: os desentendimentos sobre sucessão nos cargos de direção das empresas são talvez as mais frequentemente encontradas na realidade e podem ter um efeito devastador na condução dos negócios sociais.

Soluções propostas: (i) possuir definições claras sobre a estrutura e os papéis de cada um; (ii) montar e operar um sistema de avaliações de desempenho o mais objetivo possível; e (iii) incentivar os membros da família que se interessem pela condução dos negócios a seguirem cursos universitários ou de especialização que os capacitem para suas futuras funções na(s) empresa(s).


Questões financeiras e de investimentos: estas questões estão usualmente relacionadas com a remuneração dos membros da família que atuam na organização e aqueles que detêm simplesmente participações societárias e recebem lucros ou dividendos.

Soluções propostas: (i) contemplar estes aspectos nos estatutos, contratos ou acordos de acionistas/quotistas; (ii) conduzir o sistema de remunerações por funções, de acordo com o sistema de avaliação de desempenho antes mencionado; (iii) deixar uma “porta aberta” para aqueles acionistas/quotistas que desejem entrar na estrutura de direção da organização e (iv) estabelecer regras muito claras quanto ao reinvestimento de lucros, de modo a não prejudicar aqueles que estão somente na função de acionistas/quotistas.

Concluindo, a condução do negócio pode trazer muitos desafios. A existência de inúmeras organizações familiares bem-sucedidas e que são exemplos de crescimento e governança nos mostra que assim como há problemas, há também caminhos. O fator mais importante é criar uma cultura de procura de apoios de profissionais experientes que ajudem a superar os obstáculos, tanto nas relações familiares quanto nos negócios.